terça-feira, 12 de agosto de 2014

Entrevista com o Tricolor Ilustre Paulo Roberto Andel




Paulo Roberto Andel aderindo a campanha do talibã tricolor, em 2013: literatura e paixão pelo Fluminense.


-Como começou a torcer para o Fluminense? Influência familiar ou descoberta de que gostava do Fluminense?


Andel  - Sem dúvida, a questão familiar pesou: comecei a ir ao estádio por conta de meu pai. Mas já era Fluminense desde antes. Não sei dizer quando comecei a torcer: eu não tenho nenhuma referência de futebol em mim que não seja o Fluminense. Quando lembro das primeiras imagens no Maracanã, eu já era claramente tricolor. Há uma história engraçada disso: eu tinha uma camiseta com o escudo do Fluminense e o título “Sou Fluzão”. Devia ter uns três anos de idade. Ela foi muito usada. Anos depois, eu já adolescente, achei em casa num plástico uma camiseta idêntica, intacta, mas com o escudo do Botafogo. Fatalmente meu pai deve ter vetado o uso (risos).

                                                                                                                                     

2 2 - Quais  os  jogos  mais  emocionantes que você assistiu? Fale-nos sobre eles.


Muitos, muitos. Impossível falar de todos aqui, são muitas histórias. Mas se tiver que escolher alguns, inevitável falar de Fluminense 3 x 2 Vasco pela Copa União de 1988: foi uma partida imensa, densa, inesquecível. O Vasco favorito com um timaço, fomos lá e passamos na prorrogação, depois do Wright ter inventado obstrução dentro da área e eles terem feito 2 x 1 no fim do tempo normal. Os jogos que decidiram títulos foram espetaculares e, por si somente, foram emocionantes. Não é possível esquecer o Edinho em 1980 naquela chuvarada, nem o imortal Assis em 1983 e 1984. O Fla-Flu do gol de barriga, em 1995, é o maior de todos os tempos – escrevi um livro sobre isso, estou terminando o segundo e nem numa biblioteca inteira caberá descrever o que foi aquele dia e os minutos da partida depois do empate flamengo em 2 x 2. Há um jogo que faz os torcedores chorarem e infelizmente não pude estar presente: 3 x 1 contra o São Paulo em 2008 – meu pai faleceu naquela noite. Já vi as reprises, são de arrepiar. E jogos que não foram decisivos para títulos, mas que tiveram gols nos minutos finais – uma vocação do Fluminense. As partidas do fim de 2009 foram antológicas e me levaram a publicar meu primeiro livro. Lembro de uma que meu ídolo Marcos Caetano sempre cita: 2 x 1 contra o Náutico em 1999, debaixo da tempestade no Maraca, a torcida toda na geral (não havia ingressos para arquibancada por conta das obras), os respeitáveis engravatados completamente encharcados etc.


3) Qual o time que te impressionou mais? A Máquina de 75/76, o time de 83/84/85 ou o time da Libertadores em 2008? Fale-nos alguma coisas sobre eles.


Os três times foram espetaculares e fizeram história, cada um a seu modo e tempo. Nem tudo foi felicidade. Entendo a dor da nossa torcida por 2008 – eu estava ainda anestesiado pela morte de meu pai, é claro que me doeu, mas dadas as circunstâncias, nunca vi aquilo como um novo Maracanazzo, mas sim o aviso de que voltaremos para vencer – a história do Fluminense é marcada em campo por lágrimas e sorrisos a seguir. Foi um time que durou pouco, talvez quatro meses, mas foi arrebatador. Claro que eu queria o título, todos nós. Mas eu gosto mais do Fluminense do que das conquistas, então me doeu por não vencermos quando merecíamos muito, mas a certeza de que o Flu ainda terá o último título que ainda lhe falta – e isso não me causa qualquer diminuição por ainda não tê-lo. Perder 2008 foi injusto demais, mas voltaremos à América. Não tenho dúvidas. O time dos anos 80 foi espetacular e eu o vi de ponta a ponta. Foi um momento de resgate nosso e de muita dureza para parte da imprensa esportiva, que ansiava pelos nossos fracassos. Quem viu aquilo tudo sabe do que estou falando. E embora o Flu tenha parado de conquistar títulos naquela era em 1985, parte do time durou até 1988; ou seja, atravessou quase uma década. Não há como não falar de São Paulo Victor, do injustiçado Aldo, do craque Ricardo, do jovem Branco. Delei, uma legenda. Duílio, Tato, Jandir, Romero, Paulinho. Creio que Assis e o Washington, agora mais eternos do que nunca, representam bem aqueles tempos. Ganharam tudo; quando não ganharam, alguém garfou. A Máquina. A lenda. O sonho. Eu tinha seis anos de idade, queria comer meu cachorro quente em paz e me jogavam pro alto toda hora no Maracanã. O outro time tinha uma camisa diferente. Anos depois, descobri que era o Vasco, demos uma goleada, fomos campeões. Não me alinho com os que dizem que a Máquina não foi vitoriosa porque lhe faltaram conquistas nacionais – aliás, alguns até faltam com respeito ao time; primeiro, naqueles tempos o campeonato carioca era muito mais importante e valorizado do que o brasileiro; segundo, eu gosto mais do futebol e do Fluminense do que de seus títulos, que são muitos e serão ainda mais. A façanha do Presidente Horta em colocar o nome do Fluminense no cenário mundial, vestindo uma Seleção Brasileira com a nossa camisa, ganhando do Bayern (base da Alemanha campeã de 1974), ganhando Teresa Herrera, reduzindo adversários aqui a pó, tudo isso se tratou de algo inesquecível. Quatro décadas depois, estamos aqui falando de um time que “conquistou pouco” ou invadiu a História para sempre? Em minha opinião, o segundo caso. Basta citar os nomes de quantos cracaços vestiram nossa camisa em 1975 e 1976, mas você não precisa falar de um, dois ou oito: basta dizer Máquina e tudo está compreendido.



Caricatura de Andel: marca da sua coluna.
4) Como começou o Panorama Tricolor?

Fui censurado num site onde escrevia. O censor vulgar retalhou um texto meu sem me comunicar, desaprovei o fato. Então sugeriu-me que eu me desligasse e fosse para outro endereço, levando quem eu quisesse. Achei a ideia boa. Zeh Augusto Catalano, meu amigo, sócio e vascaíno, criou o Panorama Tricolor em poucas horas, começamos em julho de 2012 e parece que foi outro dia: temos mais de 2 mil postagens já publicadas e recebemos cerca de 150 mil visitas por mês. Gente das arquibancadas, das letras, do talento, disposta a falar do Fluminense, cronicar o dia a dia e também dar opinião sobre o futebol em geral – tanto é que estamos prestes a lançar um livro da equipe sobre a Copa de 2014. Aos poucos, fizemos do Panorama a casa da literatura tricolor, com vários autores publicados e uma grande aceitação da torcida.


5) Como começou a se formatar a idéia de escrever o livro Pagar O Quê?




Na Parmê do Largo do Machado, num jantar com João Marcelo Garcez e Luiz Alberto Couceiro, dezembro de 2012. Entre risos e lembranças, Luiz comentou que a banda podre da imprensa, para tentar abafar o tetra do Flu, logo viria com a velha conversa de “Pague a Série B”, além de que devíamos escrever algo diferente do que geralmente se lê em futebol – a história das vitórias e conquistas. Achei a ideia boa demais, imediatamente comuniquei a eles que no dia seguinte teria dez laudas prontas, todos rimos, concluímos que editora era o de menos. Em dois dias escrevi a minha parte, Luiz trouxe Janot e Cezar, eu chamei o Valterson Botelho (“Valdo, o artilheiro”) e assim fomos. Diferentemente do que muita gente pensa, “Pagar o quê?” não foi escrito no fim de 2013 para ser lançado em janeiro de 2014: ele estava pronto desde abril do ano passado, a editora é que se enrolou. Mas veio o caso Flamenguesa, fizemos um anexo daqueles dias e finalmente o livro veio à tona. Foi tão bom que os clube até diplomou os autores como Tricolores Ilustres, uma honra enorme.



Andel e seu parceiro literário, João Marcelo Garcez: à serviço da verdade dos fatos sobre o Flu.



6) Qual o livro que você e o grande tricolor João Marcelo Garcez escreveram?

Além do “Pagar o quê?”, temos mais dois em breve: um que sairá ainda este ano e outro em 2015, ambos com outros parceiros. E muito mais coisas. Podem esperar.


7) Como você visualiza a campanha do Fluminense em 2014 sob a supervisão do Mago Cristóvão?

Os que hoje estão encantados com o trabalho de treinador  de Cristóvão precisavam tê-lo visto em campo.. Craque! Tem tentado sair da mesmice, do óbvio e isso tem dado excelentes resultados ao Fluminense na  briga pela dianteira. Você vê jogadas, tabelas, giros, fruto de treinamento. O Fluminense de Cristóvão pode até não ganhar ou ser campeão, mas consegue algo fundamental: resgatar o prazer dos torcedores em assistirem futebol, seja no campo ou na TV.


8) O que você acha do trio Conca , Fred e Cícero?

Conca vai acabar tendo estátua nas Laranjeiras. Um aríete. Uma máquina. Eu temi quando ele voltou da China: não sabia se conseguiria mostrar a mesma forma física de antes. Quebrei a cara e estou muito feliz: ele parece que tem 23 anos. É um monstro, o supremo, o paradigma tricolor dos últimos anos. Uma pena que ele e Deco tenham jogado tão pouco juntos. Conca carrega em si o espírito de Marcão, Denilson, Telê e Preguinho em campo: não desiste nunca – por isso a torcida se esgoela quando seu nome aparece no placar do Maracanã. Conca no gramado parece o Neil Peart do Rush na bateria: condução, andamento e solo, tudo junto.

Fred é um dos gigantes do Fluminense nos últimos anos, alternando momentos. Essencial na superluta em 2009, fundamental no título de 2012. Tem técnica enorme, é carismático com a torcida (principalmente as crianças e as garotas), acho que futuramente pode ser um excepcional camisa 10 daqueles de antigamente, não está entre os maiores artilheiros do clube à toa. Atualmente está sendo injustiçado porque deu bobeira: ao ter topado ser figura carimbada da mídia global meses atrás, caiu na armadilha e foi crucificado na Copa porque era jogador do Fluminense, claro (ou alguém acha que, se jogasse na Gávea, iriam chama-lo de poste nos programas esportivos? Nunca!). Espero que faça ainda muito pelo Flu e que não repita as besteiras do passado. Todo mundo erra, acontece. A torcida do Fluminense é uma só, não será dividida e nem servirá de capitania hereditária para ninguém. Sobre aquelas vaias em Natal, quanta estupidez: o time leva de 7 x 1 e o atacante é o culpado? Nem todo mundo tem o exato valor de seu cérebro.

Cícero encheu os corações da torcida em 2008. Agora voltou mais maduro, certeiro, preparado. Desarma, arma, ataca, cabeceia, chuta que nem centroavante. É uma espécie de escudo do Flu no campo. Deveria ter voltado antes, mas os treinadores, sempre eles, atrapalharam.


9) O que você espera do Fluminense nesse ano de 2014?

Tomara que briguemos até o fim. O time está muito bem, ainda vai tropeçar, normal numa competição tão longa. Há outras equipes muito fortes, Cruzeiro, Corinthians, Inter, Cruzeiro – destes, todos excerto o Colorado foram campeões brasileiros recentemente. Serão dias de luta. Mas como não acreditar? Pelo menos uma vaguinha na Libertadores. O chato de plantão já diz: “ah, pensamento de torcedor de time pequeno”. Penso que é melhor uma ponderação realista do que arroubos ciclotímicos – eu não sou o torcedor que grita “é campeão!” na 15ª rodada entre 38 e nem digo que o Flu vai lutar pra não cair no primeiro passe errado. Nem ao céu, nem à Terra. Se formos penta, melhor ainda.


10) Deixe uma mensagem para a grande torcida tricolor espalhada pelo Brasil e o Mundo.




“O Fluminense respira a eternidade do poema que é” – “Pagar o quê? – Respostas à maior bravata da história do futebol brasileiro”, página 190, 2014. Um grande abraço a todos.


Paulo-Roberto Andel tem 46 anos e sempre viveu no Rio de Janeiro – a metade deles em Copacabana. Formado em Estatística pela UERJ, deixou pela metade os cursos de Matemática, Ciências Sociais e Direito. Largou o mestrado na UFRJ porque não suportava os sapatos dos colegas. Milita na literatura desde os anos 90. Um belo dia, cansado de ver o Fluminense sendo massacrado nos jornais, resolveu escrever crônicas sobre seu time a partir de 2006. Desde então, já foi publicado em diversos sites tricolores, fundou o Panorama Tricolor (www.panoramatricolor.com), escreveu quatro livros sobre o Fluminense, lançará em breve um sobre a Copa de 2014, outros cinco sobre o Tricolor até o fim de 2015. Com isso, claro, irrita a três ou quatro peganings pernósticos invejosos, mas as mulheres o adoram.



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